Entrevista com Glória Kalil
por RITA OLIVEIRA
* Entrevista com a consultora de moda e
estilo Gloria Kalil
1- A moda já lhe rendeu dois best-sellers.
Por que você resolveu falar de etiqueta?
Gloria Kalil - A preocupação com a aparência
tomou uma proporção exagerada. Agora estou dizendo aos leitores: "Chega de
imagem, cuidem da sua segurança interna". Além disso, percebi que atrás de
cada pergunta de moda há sempre uma questão maior: "Que ritual é esse para
o qual eu não sei como me vestir?" Muito da insegurança vem da falta de
informação e de convívio social. Hoje, a família nem se reúne mais em volta da
mesa de jantar. Todo mundo corre demais, cada um tem um horário, esquenta o
prato no microondas, come em frente da TV...
2- As crianças não têm com quem aprender?
Gloria - Não, porque era durante as refeições
que os pais ensinavam o básico do comportamento e da ética. Naqueles momentos,
diziam: "Senta direito, olha o cotovelo na mesa". Ou então: "Seu
amigo dedurou um colega para o professor? Isso não se faz, é muito feio".
O mundo mudou, a transmissão informal de conhecimento diminuiu e hoje reina a
falsa impressão de que não existe regra alguma. Bobagem. Os códigos precisam
ser revistos, o que não significa que é possível prescindir deles.
3- A ideia de obedecer regulamentos assusta.
Qual o motivo de tanta resistência?
Gloria - Isso acontece porque somos filhos e
netos dos anos 60, a década que rompeu com valores machistas, preconceituosos.
Porém, o fato de termos lutado contra o autoritarismo e a hipocrisia não quer
dizer que agora vale tudo! Sem educação não há civilização. O problema é que as
famílias modernas sentem-se desconfortáveis, pensando que educação é
repressão... e é mesmo. O papel dos filhos é reclamar e achar os pais uns
chatos. E o papel dos pais é serem chatos, ora! Cabe a eles repetir mil vezes,
até que a criança aprenda, que não pode comer de boca aberta nem falar alto nem
devorar toda a batata frita. Tem que dividir com os outros. Senão, quem chega
na frente come a melhor parte - esse é o princípio da barbárie. Eu não tive
filhos, mas certamente seria uma mãe insuportável... (Risos)
4- Qual é a principal regra da etiqueta
moderna?
Gloria - Prestar atenção no outro. Quem só
olha para o próprio umbigo não está apto a conviver. E atualmente isso é muito
comum, o narcisismo virou um problema social.
5- Acaba interferindo também nos
relacionamentos amorosos...
Gloria - O drama é que uma tribo não faz
concessão a outra e aí os relacionamentos ficam difíceis. Está cheio de mulher
que olha o cara e, se não gosta do sapato dele, não se dispõe a conhecê-lo...
Para escrever o capítulo sobre casais, encomendei uma enquete à equipe do meu
site. No resultado, ficou evidente um problema de código: mulher adora moda e
homem tem horror ao estilo fashion. Isso gera curto-circuito na comunicação.
Teve um cara que reclamou. Deu um vestido de presente para a namorada e ela
estreou a peça com botinas e uma jaqueta de jeans rasgada. Ele considerou um
ultraje.
6- O que aconselha para evitar desencontros
desse tipo?
Gloria - Que a mulher não fique presa ao seu
mundo. Se quer agradar a um homem, no mínimo precisa fazer um pouco de esforço
para entender o universo dele e se comunicar.
7- Podemos tomar a iniciativa da conquista?
Gloria - Não! Muitas mulheres ficam chocadas
quando digo isso, acham que é coisa do século passado. Mas eu insisto: está
interessada nele? Então não o procure. Esse não é o momento de mostrar o quanto
você é independente, e sim de observar o funcionamento dos códigos de sedução.
O fato é que o homem continua gostando de conquistar e a mulher de ser
conquistada. Se ela correr atrás dele, ele correrá dela.
8- Duas saias justas: o fim do namoro e o
reencontro com o ex. Como lidar com elas?
Gloria - Qual é a melhor hora para quebrar a
perna ou levar um fora? Isso é da vida, não há livro que resolva. Se for
abandonada, não vá perseguir o sujeito nem encha a paciência dos outros
contando mil vezes a sua história - melhor amargar sozinha. Separação é como
gripe: tem um ciclo, dói, depois passa. Caso dê de cara com o ex e a nova
namorada no restaurante, nada de fazer cena.
9- Hoje é comum uma mulher perguntar a outra
se aplicou Botox, fez plástica... É de bom-tom?
Gloria - É péssimo! A plástica, sobretudo,
devia ser abordada com o mesmo pudor dos assuntos ginecológicos. É íntimo
demais, ninguém tem de ficar bisbilhotando. Claro que amigas trocam segredos e
podem até ir juntas aplicar Botox... Mas como você se sentiria se uma conhecida
qualquer perguntasse o preço do seu sapato, por que você engordou ou se fez
preenchimento de rugas? Em geral, pessoas invasivas adoram falar dos seus
tratamentos, mostrar o silicone. Aí, é o problema contrário, você fica naquela
situação horrível: "Não, querida, eu não quero ver o seu peito..."
10- Num almoço, tudo bem se você atender o
celular?
Gloria - Se estiver aguardando uma ligação
urgente, melhor se desculpar com seu acompanhante, ser breve na conversa e
desligar o aparelho assim que resolver a pendência. Outro dia, vi duas moças
num restaurante - uma almoçou enquanto a outra ficou no celular o tempo todo. É
o fim da picada, eu teria me levantado da mesa.
11- Como os fumantes devem se comportar para
não perturbar nem ser perturbados pelos outros?
Gloria - A não ser que você more em Paris -
onde todo mundo fuma em qualquer lugar e ninguém dá a mínima -, tem que pedir
licença e perguntar se incomoda. E agir de acordo com a resposta, claro. Por
outro lado, quando é você a anfitriã fóbica e recebe um amigo fumante, é
possível, delicadamente, sugerir que ele acenda o cigarro na varanda. Mas, se
for um convidado de muita cerimônia, desista. Abra as janelas e pronto.
12- Existem normas que ajudem a mulher a
ficar segura em situações variadas?
Gloria - Sim, e também proibições (veja o
quadro). Mas etiqueta não é um exercício de memória, não se trata de decorar
regras, e sim de entender o espírito da coisa. A ideia é facilitar a vida e as
relações, nada a ver com complicar ou esnobar.
13- Eventos especiais sempre trazem dúvidas.
Qual o segredo para fazer bonito na festa?
Gloria - O fundamental é identificar o tipo
de rito, o que é valorizado naquela situação. Suponha que o convite peça traje
social completo e você decida ir de jeans. Se está convencida disso, tudo bem.
Porém, se vestiu a roupa errada porque não entendeu o convite ou não prestou
muita atenção nele, vai se sentir a última das criaturas e acabar perdendo a
noite. A segurança aumenta à medida que você vai dominando as normas. Até para
desobedecê-las, se preferir.
14- O que uma mulher precisa saber para
receber bem?
Gloria - Que o bem-estar dos convidados é
mais importante do que ter o copo certo. Também é bom lembrar que não se
convida desafetos nem um casal recém-separado para uma recepção íntima (em
festa grande pode, mas sempre é melhor avisá-los antes). A partir daí, existem
mil possibilidades. É besteira se estressar porque quer fazer um fondue para um
pequeno grupo de amigos e não tem o aparelho. Peça emprestado a uma amiga ou
alugue. Aliás, outro amigo pode trazer aquele queijo ótimo, você serve as
bebidas, a conversa engata e dá tudo certo. Não se esqueça de colocar flores na
casa e vestir uma roupa bonita: é carinhoso demonstrar que se preparou para
receber as pessoas. A situação muda em um jantar para 20 convidados. Nesse
caso, é melhor contratar uma copeira ou um bufê com serviço completo do que
ficar correndo de lá pra cá, mostrando que está tendo o maior trabalho. Aí você
nem aproveita a festa nem atende seus convidados direito.
15- O problema é querer dar o passo maior que
a perna?
Gloria - Não funciona alguém tentar aparentar
o que não é - isso é pura exterioridade, enquanto a segurança é uma condição
interna. Mas que ninguém se engane: a segurança depende de a gente se sentir
aceita pelos nossos pares, as pessoas que valorizamos, sejam elas super
tradicionais e cheias de cerimônia ou artistas informais. Você pode ser
indiferente à opinião de um determinado grupo porque a sua turma é outra. Mas,
se você se sente a tal em detrimento de todo mundo, não é segura coisa nenhuma,
é louca. Nós precisamos da aprovação do outro e vice-versa, daí a necessidade
de prestar atenção no ambiente, nas pessoas, roupas, conversas. Tudo ajuda você
a entender melhor a situação e a ficar mais à vontade.
Ela diz que não pode! No Trabalho -
Transformar sua mesa em um altar pessoal (fotos de família, latinhas coloridas,
bichinhos). - Cara feia. - Abusar do uso de roupas em tons pastel: infantilizam
e dão ar de fragilidade.
No Restaurante - Tentar furar a fila de
espera. - Tirar os sapatos debaixo da mesa. - Utilizar as seguintes palavras e
expressões que começam com d: dieta, doença, depressão, dureza, diretrizes
políticas, doutrinas religiosas.
No Casamento Se você for madrinha ou convidada:
- Usar preto no altar. - Competir com a noiva (vestido de cauda, decote até o
umbigo etc.). Se Você for Noiva: - Fazer do seu noivo uma peça de decoração (o
terno combinando com seu buquê, por exemplo).
No Relacionamento - Falar mal do ex. -
Comentar numa roda idiossincrasias (roncos, hábito de ler no banheiro...). -
Desmentir o parceiro em público. - Fazer voz de criança.
Fonte: Revista Cláudia